Agora é a hora de deliberar as florestas públicas não destinadas da Amazônia

Diante de desafios climáticos globais, destinar e proteger 50 milhões de hectares de florestas públicas pode se tornar o maior legado do Brasil para a estabilidade climática

Agora é a hora de deliberar as florestas públicas não destinadas da Amazônia

*Artigo escrito por Alexandre Mansur, jornalista e diretor de projetos do Mundo Que Queremos

A Amazônia brasileira vive um ponto de inflexão. Com quase 50 milhões de hectares de Florestas públicas não destinadas (FPNDs), uma área equivalente à Espanha ou ao estado da Bahia, expostas à ocupação ilegal, o país enfrenta uma escolha histórica. A ausência de destinação e titularidade clara transforma esses territórios em zonas de alta vulnerabilidade, onde a ação do Estado é limitada e a criminalidade avança. Grilagem, desmatamento ilegal, garimpo, tráfico de drogas e violência caminham lado a lado nessas áreas, evidenciando que a disputa fundiária deixou de ser apenas uma questão ambiental: tornou-se um problema de segurança pública, integridade territorial e soberania nacional.

Destinar essas florestas é uma medida madura, estratégica e urgente. A definição legal do status dessas áreas, seja como Unidades de Conservação, Terras Indígenas, florestas públicas para concessão ou outras figuras previstas em lei, fortalece a capacidade do poder público de coibir a apropriação criminosa do território por quadrilhas organizadas, aumenta a previsibilidade jurídica e fornece instrumentos claros para responsabilização de infratores. Ao transformar um “vazio legal” em território protegido e regulado, o Estado recupera controle, reduz a violência no campo e rompe uma das engrenagens fundamentais que alimentam o crime ambiental na região. A destinação também amplia a capacidade de atuação do Ministério Público, do sistema de justiça e dos órgãos de fiscalização, permitindo que crimes praticados dentro dessas áreas como desmatamento, mineração ilegal e lavagem de terra sejam combatidos com mais eficiência.

No contexto internacional, o Brasil chega à COP30, em Belém, com a oportunidade de apresentar um caminho concreto e robusto para acelerar suas metas climáticas e reforçar sua liderança global. Esse é o argumento conjunto do projeto Amazônia Destinada, formado pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (ABRAMPA), Ministério Público Federal (MPF), e pelos projetos Seja Legal com a Amazônia e Amazônia de Pé, além de movimentos sociais parceiros. Segundo o grupo que forma o projeto, não há solução climática global sem enfrentar o problema estrutural das FPNDs. A destinação massiva e ordenada dessas áreas não só reduz riscos de novos ciclos de desmatamento, mas também garante segurança jurídica, proteção dos direitos territoriais de povos indígenas e comunidades tradicionais e estabilidade ecológica em uma região crítica para o planeta.

Diante de desafios climáticos em escala global, o Brasil tem a chance de transformar a destinação de florestas públicas em um legado duradouro. As FPNDs são fundamentais para regular o regime de chuvas da América do Sul, estabilizar temperaturas, proteger a biodiversidade e evitar emissões futuras de carbono associadas ao desmatamento. Hoje, por permanecerem sem destinação, alimentam um ciclo de destruição que ameaça não apenas o clima, mas também as vidas humanas e a governança territorial.

A atuação integrada do projeto Amazônia Destinada combina pesquisa científica e análise jurídica com uma campanha estratégica de comunicação voltada a setores públicos, privados e à sociedade civil. O objetivo é fornecer evidências, dados e recomendações para acelerar o processo de destinação, apoiar decisões nos níveis federal e estadual e fortalecer mecanismos legais que protejam as florestas públicas do avanço do crime ambiental. É uma agenda baseada em conhecimento, legalidade e compromisso com o território e, sobretudo, com o futuro climático do Brasil e do mundo.

Com a COP30 como vitrine e com a atenção internacional voltada à região amazônica, este é o momento de transformar intenção em ação. Destinar as florestas públicas não destinadas da Amazônia é garantir soberania, segurança, clima e justiça. É assegurar que o Brasil fale com autoridade na conferência e lidere, com evidência e coragem, as soluções para os desafios ambientais do século XXI.