Um método relativamente simples de análise estatística é capaz de prever com mais precisão o risco de deslizamentos de terra causados por chuvas intensas. A conclusão é de um estudo coordenado por pesquisadores do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo (ICMC-USP), em São Carlos, e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Estratégia foi validada com base nas tempestades de São Sebastião (SP) em 2023;
Novo modelo apresentou desempenho superior ao método tradicionalmente usado;
Sistema é acessível e pode ser operado por prefeituras com softwares livres.
Em artigo publicado no periódico Scientific Reports, a equipe comparou a eficiência da nova abordagem (AHP Gaussiano) com a técnica clássica. O resultado foi uma classificação mais assertiva das áreas vulneráveis.
“Embora os ganhos quantitativos sejam modestos, o método apresenta vantagens significativas: reduz ambiguidades e apresenta maior alinhamento com o comportamento real dos deslizamentos no território”, explica Rômulo Marques-Carvalho, doutorando do ICMC-USP e primeiro autor do estudo.
“O método reduz ambiguidades e apresenta maior alinhamento com o comportamento real dos deslizamentos no território”
Como funciona a inovação
Em avaliações de risco, o método tradicional (AHP Clássico) compara pares de variáveis — como inclinação do terreno e proximidade de rios — baseando-se muito na opinião subjetiva de especialistas.
Já a nova proposta aplica o AHP Gaussiano. “O termo se refere ao fato de que o método utiliza a distribuição gaussiana, ou curva de Gauss. Ela equivale à curva de distribuição de probabilidade, definida por média e desvio-padrão”, detalha Cláudia Maria de Almeida, coautora do estudo e pesquisadora do Inpe. Isso permite definir os pesos de cada fator de forma objetiva e matemática.
Teste de fogo: São Sebastião
Para validar a técnica, os pesquisadores utilizaram dados reais de São Sebastião, município castigado pelas chuvas em fevereiro de 2023. A equipe mapeou 983 pontos de início de deslizamento e 1.070 áreas afetadas.
O novo modelo atribuiu 26,31% da região analisada à categoria de “suscetibilidade muito alta”, contra uma estimativa de 23,52% do método antigo, demonstrando maior sensibilidade para detectar o perigo real.
A análise revelou ainda que a geomorfologia (formas do relevo) e a distância de estradas são fatores críticos. “A proximidade de estradas é importante porque sua construção em locais de relevo acidentado pressupõe a execução de obras de movimento de terra, como cortes e aterros, que geralmente levam a uma instabilidade das encostas”, explica Almeida.
Aplicabilidade e Futuro
O trabalho, apoiado pela Fapesp, oferece uma ferramenta poderosa para o poder público. “O método é simples de aplicar. Uma prefeitura precisaria apenas dos dados geoespaciais básicos e de um computador comum com QGIS [software livre]”, destaca Marques-Carvalho.
Segundo o orientador do estudo, André Ferreira de Carvalho, a abordagem tem potencial para monitorar outros problemas ambientais agravados pelas mudanças climáticas, como incêndios, desmatamento e desertificação.
Com informações de Reinaldo José Lopes, da Agência Fapesp