Crise de hospedagem da COP30 é reportada por mais de 20 países e chega à ONU

Cidade de Belém no Pará, Capital da Cop30 Brasil. Foto: Rafa Neddermeyer/Cop30 Brasil

Poucos meses depois de ser anunciada como sede da maior conferência climática do mundo, Belém (PA) passou a ser alvo de críticas da comunidade internacional. A cidade foi escolhida para mostrar o compromisso da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas com a Amazônia, mas acumula acusações de não possuir estrutura para acomodar os participantes do evento.

Mesmo com a garantia de investimentos públicos na cidade, o governo federal não conseguiu cessar apontamentos sobre a falta de saneamento básico – principalmente nos bairros fora do Polígono COP30 situados às margens dos canais – e a insuficiência da rede hoteleira paraense.

Esse último tópico, que indicou a cidade como incapaz de receber os mais de 50 mil participantes do evento, ainda acusou empresários belenenses de superfaturar preços de hotéis, o que dificultaria – e, em casos extremos, até impossibilitaria – a presença de certas nações na COP. 

Entenda a crise hoteleira

O anúncio que oficializou Belém como sede da COP30 2025 gerou uma corrida imobiliária local que tem tornado os preços das acomodações abusivos e exorbitantes. Autoridades de todo o globo direcionam críticas ao Brasil e mostram-se insatisfeitos com as possibilidades de estadia.

Em junho deste ano, ocorreram reuniões em Bonn, na Alemanha, para apresentar os planos de logística da COP30, conduzidas por Valter Correia, secretário extraordinário da conferência. Os delegados internacionais não pouparam críticas à organização brasileira e cobraram clareza em relação às estadias. 

Segundo diversos líderes e diplomatas estrangeiros, os preços cobrados por hotéis e sistemas de hospedagem estão muito acima do viável, além de apresentarem pouca disponibilidade. Não é incomum que cidades-sedes de eventos internacionais aproveitem a oportunidade para aumentar valores de serviços, mas a situação vista em Belém parece ultrapassar níveis usuais.

Um dos principais argumentos é que os altos custos de hospedagem em Belém impossibilitariam a participação de jurisdições mais pobres, que não têm condições de arcar com os preços abusivos. Outras ainda consideram mandar equipes reduzidas, a fim de contornar as despesas, ou até não participar.

“Há uma sensação de revolta dos países por essa insensibilidade, sobretudo por parte dos países em desenvolvimento. Ficou público que os países estão pedindo para o Brasil tirar a COP de Belém”, disse o presidente da COP30, André Corrêa do Lago, sobre a crise.

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Comunidade internacional faz apelo

A desaprovação de delegações globais em relação à Belém incluiu ameaças sobre o esvaziamento das cadeiras da conferência. A turbulência culminou na divulgação, no começo de agosto, de uma carta assinada por mais de 25 países solicitando condições mínimas de acomodação e custo para a COP30, “seja em Belém ou em outro lugar”. Tal atitude deflagrou a disposição de várias jurisdições em transferir a sede para outra cidade. 

“Estamos profundamente preocupados com a persistente falta de acomodações adequadas e acessíveis, bem como com a falta de clareza de que isso será resolvido a tempo. Isso afeta a todos: delegados, observadores, representantes de povos indígenas e até mesmo representantes empresariais”, escreveu a carta.

O governo já havia tentado mitigar os problemas quando, em julho, contratou dois navios como unidades de hospedagem para a COP. Além da garantia de 3.900 cabines, com capacidade de até seis mil leitos, a gestão Lula prometeu reservar quartos gratuitos para delegações mais pobres.

Isso não parece ter surtido efeito suficiente para reverter a crise, com países acusando a conferência de perder o caráter de inclusão. A carta de apelo também pede que os preços para delegações mais pobres sejam alinhados ao subsídio diário de US$ 164 limitado pela ONU, e que “permaneçam dentro dos limites aceitáveis para aqueles provenientes de economias mais desenvolvidas”.

“Para as delegações menores, que muitas vezes são de países menos desenvolvidos, pequenos Estados insulares em desenvolvimento ou países africanos, participar da COP em número suficiente já é cada vez mais desafiador”, diz o documento.

Quais países relataram problemas com acomodações em Belém

Ao todo, 29 delegações assinaram a carta de apelo solicitando a resolução da crise hoteleira. São elas, acompanhadas de seus respectivos representantes:

  • Grupo Africano de Negociadores (AGN) – Richard Muyungi 
  • Áustria – Simon Ellmauer-Klambauer 
  • Bélgica – Peter Wittoeck
  • Belize – Edalmi Pinelo
  • Canadá – Jeanne-Marie Huddleston
  • Chipre – Demetris Psyllides
  • República Tcheca – Pavel Zámyslický
  • Estônia – Katre Kets
  • Finlândia – Marjo Nummelin
  • Guatemala – Rita Mishaan
  • Ilhas Cook – Wayne King
  • Ilhas Marshall – Clarence Samuel
  • Islândia – Helga Barðadóttir
  • Irlanda – Kevin O’Donoghue
  • República da Coreia – Keeyong Chung
  • Letônia – Aiga Grasmane 
  • Grupo dos países menos desenvolvidos (LDC) – Evans Davie Njewa
  • Lituânia – Vilija Augutaviciene
  • Luxemburgo – Georges Gehl
  • Malta – Joseph Caruana
  • Países Baixos – Jori Keijsper
  • Noruega – Marianne Karlsen
  • Palau – Xavier E. Matsutaro
  • Panamá – Juan Carlos Monterrey 
  • Polônia – Katarzyna Wrona
  • Eslováquia – Jozef Škultéty 
  • África do Sul – Maesala Kekana
  • Suécia – Mattias Frumerie
  • Suíça – Felix Wertli

Quais países desistiram de participar

Conhecido pelo negacionismo climático, o presidente americano Donald Trump desfez o Escritório de Mudanças Globais do Departamento de Estado e deve ficar de fora da COP30. Além de não cultivar boas relações com o mandatário brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o republicano chegou a ser classificado como persona non grata por políticos de Belém devido às tarifas sobre produtos nacionais.

Por outro lado, motivado pela crise hoteleira, o presidente da Áustria, Alexander Van der Bellen, cancelou sua participação na COP30 – assim como da delegação austríaca –  alegando “custos elevados” da viagem e da hospedagem em Belém.

Já o vice-ministro do Clima da Polônia, Krzysztof Bolesta, sinalizou no início de agosto que ainda não possuíam acomodações. “Provavelmente teremos que reduzir a delegação ao mínimo. Em um caso extremo, talvez tenhamos que desistir de comparecer”, declarou.