O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) defendeu nesta sexta-feira que o mundo precisa de um caminho contra combustíveis fósseis na abertura do segundo dia da Cúpula do Clima, em Belém (PA). Nesta rodada de conversas, os líderes mundiais debatem a transição energética.
“O mundo precisa de um mapa do caminho claro para acabar com essa dependência dos combustíveis fósseis. É tempo de diversificar nossas matrizes energéticas, ampliar as fontes renováveis e acelerar a produção e o uso de combustíveis sustentáveis”, afirmou Lula.
O presidente brasileiro disse ainda que os debates sobre transição energética passam necessariamente por discussões sobre minerais críticos. “É impossível discutir a transição energética sem falar dos minerais críticos essenciais para a fabricação de baterias, painéis solares e sistemas de energia.”
“Para gerar emprego e renda e gozar de segurança energética, os países em desenvolvimento precisam participar de todas as etapas dessa cadeia global de valor”, acrescentou.
No discurso durante a sessão, voltada para o debatedor sobre a transição energética, Lula também disse que o mundo não comporta mais um modelo de desenvolvimento centrado na queima de combustíveis fósseis e que a ciência já dá alternativas para um crescimento focado na energia limpa.
O presidente também defendeu em seu discurso a necessidade de se criar “tecnologias de financiamento” externas para o Sul Global.
Chefes de Estado, líderes de governos e representantes de alto nível de mais de 70 países estão em Belém para participar do evento. Considerando embaixadores e pessoal diplomático, a lista ultrapassa uma centena de governos estrangeiros representados na capital paraense.
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Confira o discurso
Leia a íntegra do discurso
As decisões que tomarmos com relação ao setor energético definirão nosso sucesso ou nosso fracasso na batalha contra a mudança do clima.
Foram necessárias 28 COPs do clima para nos comprometermos, em Dubai, com uma transição energética justa, ordenada e equitativa.
A Terra não comporta mais o modelo de desenvolvimento baseado no uso intensivo de combustíveis fósseis que vigorou nos últimos 200 anos.
75% das emissões de gases do efeito estufa têm origem na produção e no consumo de energia.
Não podemos nos omitir ou intimidar diante da magnitude desse dado.
Já sabemos que não é preciso desligar máquinas e motores, nem fechar fábricas ao redor do mundo de um dia para o outro.
A ciência e a tecnologia nos permitem evoluir de forma segura para um modelo centrado nas energias limpas.
Essa transformação já está em curso.
O uso de renováveis triplicou nos últimos dez anos.
No primeiro semestre de 2025, a energia renovável se tornou a maior fonte individual de geração de eletricidade no mundo, ultrapassando o carvão.
Em muitas regiões, as energias solar e eólica já são mais baratas do que a gerada por combustíveis fosseis.
O preço das baterias caiu 90%.
O Brasil não tem medo de discutir a transição energética.
Somos líderes nessa área há décadas.
Ainda nos anos 1970, fomos o primeiro país a investir em larga escala em alternativas renováveis.
90% da matriz elétrica nacional provém de fontes limpas.
Também somos pioneiros no desenvolvimento de motores flexíveis e o segundo maior produtor mundial de biocombustíveis.
Nossa gasolina tem 30% de etanol em sua composição e nosso diesel conta com 15% de biodiesel.
O etanol é uma alternativa eficaz e imediatamente disponível para adoção nos setores mais desafiadores, como a indústria e os transportes.
É lamentável que pressões e ameaças tenham levado a Organização Marítima Internacional a adiar esse passo.
A transição energética representa um novo paradigma de desenvolvimento e uma grande oportunidade para promover transformações estruturais na sociedade e na economia.
Em 2023, o setor foi responsável por 10% do crescimento do PIB global e empregou 35 milhões de pessoas.
É impossível discutir a transição energética sem falar dos minerais críticos, essenciais para a confecção de baterias, painéis solares e sistemas de energia.
Para gerar emprego e renda e gozar de segurança energética, os países em desenvolvimento precisam participar de todas as etapas dessa cadeia global de valor.
Senhoras e senhores,
Apesar dos avanços, 2024 registrou novo recorde de emissões de carbono do setor energético, o maior índice desde 1957.
Os incentivos financeiros muitas vezes vão no sentido contrário ao da sustentabilidade.
No ano passado, os 65 maiores bancos do mundo se comprometeram a conceder 869 bilhões de dólares para o setor de petróleo e gás.
Desde a adoção do Acordo de Paris a participação dos combustíveis fósseis na matriz energética global diminuiu apenas de 83% para 80%.
O conflito na Ucrânia reverteu anos de esforços para redução de emissões de gases de efeito estufa e levou à reabertura de minas de carvão.
Gastar com armas o dobro do que destinamos à ação climática é pavimentar o caminho para o apocalipse climático.
Não haverá segurança energética em um mundo conflagrado.
É fundamental combater todas as formas de pobreza energética.
2 bilhões de pessoas não têm acesso a combustíveis adequados para cozinhar.
660 milhões de pessoas dependem de lamparinas ou de geradores a diesel nas periferias das grandes cidades e nas comunidades rurais da América Latina, da África e da Ásia.
200 milhões de crianças frequentam escolas sem acesso à luz elétrica.
Sem energia, também não há conexão digital, hospitais funcionando ou agricultura moderna.
Sem equacionar a injustiça de dívidas externas impagáveis e sem abandonar condicionalidades que discriminam os países em desenvolvimento, andaremos em círculos.
Um processo justo, ordenado e equitativo de afastamento dos combustíveis fósseis demanda o acesso a tecnologias e financiamento para os países do Sul Global.
Há espaço para explorar mecanismos inovadores de troca de dívida por financiamento de iniciativas de mitigação climática e transição energética.
Direcionar parte dos lucros com a exploração de petróleo para transição energética permanece um caminho válido para os países em desenvolvimento.
O Brasil estabelecerá um Fundo dessa natureza para financiar o enfrentamento da mudança do clima e promover justiça climática.
O mundo precisa de um mapa do caminho claro para acabar com essa dependência dos combustíveis fósseis.
É tempo de diversificar nossas matrizes energéticas, ampliar as fontes renováveis e acelerar a produção e o uso de combustíveis sustentáveis.
Isso requer alguns compromissos centrais:
Em primeiro lugar: implementar o acordo de Dubai de triplicar a energia renovável e de dobrar a eficiência energética até 2030.
Em segundo lugar: colocar a eliminação da pobreza energética no centro do debate e incluir metas de cocção limpa e de acesso à eletricidade nos planos climáticos nacionais.
Em terceiro lugar: aderir ao Compromisso de Belém para quadruplicar o uso de combustíveis sustentáveis até 2035 e acelerar a descarbonização dos setores mais desafiadores.
Os cientistas já cumpriram seu papel.
Nesta COP, os negociadores devem buscar o entendimento.
E nós, os líderes, devemos decidir se o século XXI será lembrado como o século da catástrofe climática ou como o momento da reconstrução inteligente.
Muito obrigado.
COP30
A Cúpula do Clima antecede a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), que será realizada de 10 a 21 de novembro, também em Belém. O objetivo é atualizar e reforçar os compromissos multilaterais para lidar com a urgência da crise climática.
Na prática, a Cúpula do Clima busca dar peso político às negociações que se seguirão pelas próximas duas semanas de COP30.